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domingo, 9 de novembro de 2014

O mar vai subir, recursos vão escassear... e o homem terá que ser mais criativo


Na reunião em casa de amigos, alguém levantou a questão:

---- Nem se tivesse dinheiro eu compraria um apartamento na Avenida Atlântica! Se o mar vai subir, como vão ficar aqueles prédios? Não quero deixar um abacaxi para meus descendentes.

Lembrei-me logo de uma reportagem que fiz em 2008 para o “Razão Social”, apresentando um estudo feito pelo Fórum de Mudanças Climáticas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Entrevistei, na época, José Aroudo, um dos responsáveis pela pesquisa, e ele foi categórico: “O nível do mar vai aumentar cerca de 40 centímetros aqui no Sudeste nos próximos cem anos e, se até lá ainda existir o Copacabana Palace, as ondas vão bater na mureta do prédio”.
Um dos focos da pesquisa era a agricultura. E José Aroudo descobriu, depois de muitos cálculos, que vai haver uma perda acentuada na produção de grãos, sobretudo de café, também aqui no Sudeste. Os resultados apontaram que, por conta de salinização do solo, os produtores vão ter que buscar terras mais altas em Minas Gerais ou no Espírito Santo para plantar café. Para estarem mais perto de suas matérias-primas, as corporações vão procurar também esses lugares para instalarem suas fábricas, o que vai provocar ainda uma migração dos centros econômicos.

Confesso que tudo isso ficou só na minha cabeça porque, instantes depois de o convidado ter declarado seu receio por morar à beira do mar, a turma dos céticos entrou em ação. O contra-ataque veio com o discurso de sempre: ainda não existem provas de que a Terra está aquecendo mesmo; que o planeta passa por períodos frios e quentes independentemente da quantidade de gás que se emite. E que, caso realmente vá acontecer um período de aquecimento, isso não vai afetar nossos descendentes diretos.

---- Prefiro não me arriscar --- contestou o previdente.

Ainda bem que a conversa não se alongou neste tom tão dialético, com apenas dois lados, porque o clima poderia esquentar, de fato, ali na sala. Aproveitamos para ampliar o assunto, e foi bom. Uma amiga se lembrou que lera uma pequena reportagem do “The Wall Street Journal” replicada pelo “Valor Econômico” dando conta, vejam só, de que a indústria do cacau, no mundo, está sofrendo com uma oferta aquém da demanda já há duas temporadas consecutivas. Não é uma boa notícia para os chocólatras, sobretudo na véspera da Páscoa. Mas está acontecendo.

Fui buscar o texto, publicado no dia 21 deste mês, sexta-feira passada, assinado por Leslie Josephs. Na verdade, a reportagem apresenta uma variedade de cacaueiro, conhecida como CCN51, que foi desenvolvido no Equador por um agrônomo há quase 50 anos e que pode ter uma produtividade quatro vezes superior ao cacau. É que a safra de cacau que terminou em setembro do ano passado deixou os fabricantes de doces bem aflitos, com 174 mil toneladas abaixo do esperado. E este ano, de acordo com a Organização Internacional do Cacau (OIC), espera-se que a demanda vá superar a oferta em 115 mil toneladas.

As mudanças do clima teriam a ver com o fenômeno? Fica em mim a desconfiança de que as terras que serviam para plantar cacaueiros andam mudando de perfil. De novo penso na pesquisa do Ipea: ora, se nossos grãos serão afetados no futuro, por que já não estaria acontecendo algo semelhante com o cacau? Mas a reportagem não fala sobre isso. O responsável pelo arrefecimento da produção seria o excesso de consumo. É que os países emergentes têm conseguido dar a suas populações a chance de esvaziarem as prateleiras de bombons, barras e doces como nunca haviam feito. E como os países ricos sempre fizeram, cá para nós...

O texto do “Valor” tem outra informação interessante: o Brasil está entre os maiores produtores de cacau do mundo e, pelas estimativas da OIC, produziu 185 mil toneladas na safra 2012/2013 a menos do que as 220 mil toneladas da safra anterior.

A questão do novo grão criado pelo equatoriano e que ganhou o estranho nome de CCN 51 é que, segundo os entendidos em chocolate, ele é menos saboroso. Mas tem alto teor de manteiga de cacau, que dá a consistência cremosa ao chocolate. Seja como for, a suíça Lindt&SprungliAG, ouvida pela reportagem, disse que jamais vai usá-lo. E já está se preparando para gastar muito em pesquisa a fim de encontrar uma forma de testar o DNA do grão de cacau e eliminar as variedades indesejadas.

“Alguns confeiteiros temem que as árvores do CCN51 acabem substituindo as variedades ricas e saborosas do cacau da Bacia do Rio Amazonas, onde o produto teve sua origem”, diz a reportagem.
Não pude deixar de me lembrar de uma história recente que vivi envolvendo a Martha Neiva Moreira, no tempo em que dividíamos a redação do Razão Social. Martha é chocólatra assumida, daquelas que conseguem devorar uma barra inteira em minutos. Já eu, há algum tempo, estou tentando diminuir a lactose da minha dieta e, numa dessas buscas por produtos com baixo teor, encontrei o alfarroba. Trata-se do fruto de uma árvore originária de Portugal que é bem parecido com o cacau. Para mim, que não sou muito fã de chocolate, os produtos de alfarroba servem como uma luva. Achei tão gostosos que um dia levei para a redação e ofereci a Martha, como opção mais saudável porque não tem tanta gordura e açúcar. Ela franziu a testa, fez careta:

---- Olha, isso aqui pode ser tudo, menos alguma coisa que vá substituir o chocolate! Não vai colar!
Essa questão importante, o sabor, explica a preocupação das empresas que fazem menos foco na grande escala do que na garantia de que o cliente vai sentir vontade de comprar novamente o mesmo produto. O grão CCN 51, mais ácido, assim, serve mais para os fabricantes que querem encher as prateleiras. E, segundo a reportagem, na África alguns produtores de cacau levantaram outra bandeira que não se pode desprezar. Segundo eles, uma mudança para uma única variedade de grão pode deixar a fonte de quase 70% do fornecimento de cacau do mundo suscetível a doenças.

Como se vê, a humanidade vai ter que usar muito a criatividade para viver num mundo cheio de riscos e se safar deles. Vejam mais esta: há quatro dias, aqui mesmo no G1, assisti a uma entrevista do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, negando-se a permitir que São Paulo bombeie água do Rio Paraíba do Sul para amenizar a seca que está vivendo. Legitimamente, Cabral defendeu seu território:

“Só temos um rio e muitas casas e empresas. Não posso tolerar nada que afete o abastecimento de água. Isso é um assunto sério que precisa ser tratado por nossos técnicos. Nem eu nem o Alckmin (governador de São Paulo) somos conhecedores.”

Pois é, como eu ia dizendo: viver num mundo com menos recursos, com tantas mudanças climáticas, vai exigir muito mais de todos nós. Até pensar bem se vale a pena comprar um imóvel perto do mar, está valendo. Infelizmente, porém, na hora de se adotar políticas de prevenção, tudo isso fica no esquecimento.

http://g1.globo.com/natureza/blog/nova-etica-social/post/o-mar-vai-subir-recursos-vao-escassear-e-o-homem-tera-que-ser-mais-criativo.html

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